Activistas angolanos pretendem realizar uma manifestação no próximo dia 28 em Luanda para contestar a detenção de activistas e o homicídio de vendedoras ambulantes por agentes policiais, disse hoje fonte da organização.
Segundo a activista Laurinda Gouveia, na segunda-feira foi submetida ao Governo Provincial de Luanda a carta que dá a conhecer às autoridades a intenção, sendo hoje o último dia para uma resposta ao documento, em caso de rejeição.
“O Governo tinha que nos responder até hoje. Se não respondeu é porque não há nenhum inconveniente, logo, não temos necessariamente que ter um plano B, e porque o local que escolhemos para a concentração não tem sido comum”, referiu Laurinda Gouveia, uma das activistas envolvidas no processo que ficou conhecido como os “15+2”, de 2015.
A manifestação tem como local de concentração o largo das Heroínas, tendo como destino final um ministério que, de facto, não existe – o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos.
Laurinda Gouveia frisou que a marcha tem como principal objectivo chamar atenção das autoridades para a libertação de presos políticos e o respeito pela vida das zungueiras.
“Há um mês foi morta uma zungueira pela polícia e as perseguições a estas senhoras continuam, elas que buscam as ruas para poderem buscar dignidade, algo para os seus filhos, o que o nosso Governo não dá”, salientou a activista, que acrescentou que a manifestação também pretende exigir a “libertação dos companheiros que estão presos até ao momento”.
A activista citou o caso de ‘Tanaice Neutro’, que se encontra doente e supostamente sem tratamento médico, e de ‘Zecamutchima’, condenado e a cumprir a pena na província de Benguela.
O activista Gilson da Silva Moreira, conhecido como ‘Tanaice Neutro’, foi condenado a um ano e três meses de prisão, com pena suspensa por dois anos, pela prática do crime de ultraje contra o Estado, seus símbolos e órgãos.
‘Tanaice Neutro’ foi condenado por, supostamente, ter insultado o Presidente da República, general João Lourenço, e efectivos da Polícia Nacional, em vídeos que gravou e partilhou nas redes sociais.
Já o activista José Mateus ‘Zecamutchima’, líder do Movimento do Protectorado Português Lunda Tchokwe, foi condenado a quatro anos e meio de prisão pelos supostos crimes de associação criminosa e incitação à rebelião, devido a incidentes registados em Cafunfu, província da Lunda Norte, na sequência de uma manifestação onde a Polícia Nacional (do MPLA) assassinou centenas de pessoas.
Os activistas esperam mobilizar um grande número de pessoas, especialmente zungueiras, “apesar do contexto, em que as pessoas estão cheias de medo de reivindicarem algum direito que seja”.
“Apesar de que até agora o direito à manifestação não é uma cultura, principalmente para este grupo vulnerável que são as zungueiras, porque elas preferem estar a vender que fazer uma manifestação, por entenderem que com uma manifestação não levam comida para casa”, reconheceu.
A Polícia do MPLA tem reprimido ou travado, nos últimos tempos, todas os protestos convocados por activistas e outros angolanos (jornalistas, por exemplo), que não têm conseguido concentrar-se nos locais previstos.
A RAZÃO DA FORÇA DOS DITADORES
A Polícia do MPLA disse no dia 21 de Fevereiro de 2020 que o uso da força em manifestações “muitas vezes resulta de desobediência dos cidadãos”, afirmando que a polícia é chamada para “garantir o livre exercício de reunião ou interditar manifestações violentas”.
“Em primeiro lugar a polícia é chamada para garantir o livre exercício de reunião e/ou de manifestação, em segundo lugar a polícia pode ser chamada para interditar aquelas manifestações que violem a lei sobre reunião e manifestações”, respondeu na altura o director do gabinete de Estudos, Informação e Análise do Comando Geral da Polícia angolana, José Carlos da Piedade.
Segundo o comissário da Polícia do MPLA, em manifestação a polícia é chamada para actuar em duas perspectivas e a repressão surge em manifestações “que à partida sejam violentas ou aquelas que de um modo geral possam violar direitos fundamentais dos cidadãos”.
“O uso da força muitas vezes resulta de desobediência dos cidadãos”, disse à margem do acto de lançamento das festividades do 44.º aniversário da Polícia do MPLA.
Agosto de 2016. Em entrevista-encomenda ao boletim oficial do regime (Jornal de Angola), o juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar (do MPLA), general António dos Santos Neto “Patónio”, considerou que os militares das FAA (sob comando do general Wala) que assassinaram o adolescente António Rufino, ocorrida no Zango, agiram em legítima defesa.
O juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA tinha toda a razão. Os militares em serviço no Zango estavam, afinal, fortemente armados… apenas com leques (para enfrentar o calor) e, por isso, viram-se em perigo quando o puto Rufino tirou do bolso todo um arsenal capaz de derrotar o próprio Exército… Islâmico.
Além disso, como certamente sabia o general “Patónio”, o Rufino foi atingido “em flagrante delito” quando se preparava para uma actividade criminosa, evidenciando “actos preparatórios para a prática de rebelião e atentado contra o Presidente da República”. Exactamente o mesmo cenário dos manifestantes que contestavam a tomada de posse do juiz Manico como soba da Comissão Nacional de Eleições, sucursal do MPLA para a fraude eleitoral.
Perante isso os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Aliás, esses ou esse militar deveria ser promovido. É o mínimo que o regime poderia fazer por ele. Tal como deveria ser promovido José Carlos da Piedade.
Nesse flagrante delito, como certamente consta do relatório na posse do juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA, os militares descobriram em poder do jovem Rufino diverso material bélico, altamente letal, caso de esferográficas BIC (azuis), um lápis de carvão (vermelho), blocos de papel (brancos) e, tanto quanto o Folha 8 apurou na altura, um livro (de bolso) sobre como derrubar as ditaduras.
Sabe-se, igualmente, que os militares do general Wala descobriram que o perigoso jovem activista (tal como recentemente aconteceu com a zungueira assassinada) tinha mísseis escondidos nas lapiseiras, Kalashnikovs camufladas no telemóvel e outro armamento pesado e letal disfarçado nos blocos de apontamentos. Eram, reconheça-se, provas mais do que suficientes para provar que estava a preparar um golpe de Estado.
Perante isso, os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Legítima defesa pura e simples, segundo o general “Patónio”.
O jovem estava no seu quartel-general no Zango, por sinal uma forte estrutura terrorista disfarça da habitação precária, numa reunião dos seus estrategas militares que planeavam – como os Revús – um golpe a partir da leitura do livro “Da ditadura à democracia — Uma estrutura conceptual para a libertação”, do norte-americano Gene Sharp.
Mais ao fundo, no quintal, debaixo de um coberto de zinco, o exército terrorista mobilizado pelo jovem Rufino (talvez uns milhares de guerrilheiros, não general “Patónio”?) afinava os códigos para lançamento dos mísseis e, talvez, até de ogivas nucleares contra a residência do então Presidente do MPLA, José Eduardo dos Santos.
Perante isso os militares não tiveram alternativa. Deram um tiro no perigosíssimo terrorista chamado António Rufino. Legítima defesa pura e simples, segundo o general “Patónio”.
Com todo este manancial de provas, o juiz-conselheiro-presidente do Tribunal Militar do MPLA não teve dúvidas. Foi legítima defesa. Não foi, pois, difícil aos servos do general “Patónio”, provar que o jovem Rufino estava envolvido (seria mesmo o comandante) numa conspiração para a “destituição do Presidente da República e de outros órgãos de soberania”.
Não foi difícil saber o que o Ministério Público do MPLA, com o apoio do Tribunal Militar do MPLA, escreveu na análise ao caso. Será algo do tipo: “Os factos descritos evidenciam claramente que a vítima participara em reuniões com vista a traçar estratégias e acções, tais como manifestações, greves e desobediência civil generalizada, conducentes à destituição do Governo e do Presidente da República”.
Dirão igualmente que o jovem Rufino liderava reuniões no Zango que visavam “mobilizar as massas populares ideais para desacreditar a governação do executivo angolano”.
Ainda com a perspicácia investigativa dos melhores peritos do país, será mais uma vez possível concluir que nesses “encontros de concertação”, o Rufino preparava a máquina de guerra para “destituir o poder político em Angola”.
Ao Tribunal Militar do MPLA não escapou também a análise conspirativa dos frustrados (como na altura chamou aos jovens o próprio Eduardo dos Santos) do Zango, atentos leitores de uma “suposta obra de Domingos da Cruz com o título “Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura: Filosofia para a libertação de Angola”, uma adaptação do livro de Gene Sharp “Da Ditadura à Democracia”.
Pedagogicamente, ou não fôssemos todos matumbos, o Tribunal Militar do MPLA explicou que essa obra “inspirou as chamadas revoluções nos países da Europa de Leste, países nórdicos, africanos, como a Tunísia, o Burkina Faso, Egipto e Líbia, cujas consequências de tão nefastas deixaram os países atingidos completamente na desgraça, destruídos pelo vandalismo e pelas guerras que se seguiram”.
O Tribunal Militar do MPLA não teve, é claro, dificuldade em comprovar que o jovem Rufino dava aulas aos seus seguidores em que “explicava a metodologia e objectivos a perseguir e preparação de acções para a destituição do Presidente da República, ao que seguiria a criação de um governo de transição”.
“O jovem Rufino planeava formar um governo de salvação nacional e elaborar uma nova Constituição”, disseram os peritos dos generais “Patónio” e Wala, mostrando que o terrorista Rufino até já tinham gente a trabalhar num novo governo e numa nova constituição. É obra, reconheça-se.
Folha 8 com Lusa